Se me formei em Filosofia ou Sociologia, qual é a importância que tenho na sociedade? Em que sector de trabalho me enquadro? Na semana passada publiquei um texto intitulado A(s) Asneira(s) de Jair Bolsonaro no Jornal Sábado. Um amigo, que por sinal admiro-lhe como um ser pensante, leu-o e ficou inquietado com a minha opinião em relação aos pronunciamentos do presidente do Brasil. Ele telefonou-me e com uma subtileza incomparável disse que queria me visitar. Era Domingo e o inverno deste ano confunde o corpo e consequentemente a garganta. Fazia um pouco de calor e, por isso, o meu amigo prometeu comprar umas cervejas para que pudéssemos conversar num à-vontade. Curiosamente, à sua chegada por volta das 14h, pediu para que fosse comprar 1 litro de refrigerante. Depois de tomarmos o refrigerante, o meu amigo quis saber porquê eu não apreciei a decisão do Bolsonaro e o seu ministro ao prometer cortar os investimentos nas Faculdades de Ciências Humanas! Fiquei boquiaberto enquanto ele falava. Como é que um jovem formado em Filosofia concordaria com Jair Bolsonaro? Ele acrescentou que fez este curso porque julgou que era mais fácil, mas se tivesse outra oportunidade teria feito um curso mais técnico. Perdoei a desculpa, pois supôs que a dor falava por ele.
Antes de responder às perguntas acima é preciso entender o pensamento do Estado. O que estará por detrás do corte de investimento a ciências humanas no Brasil? A resposta óbvia e de pendor político seria: Melhorar a vida profissional dos brasileiros. Através das leis, qualquer Estado tem o poder de tomar decisões pela maioria. Esta foi a contribuição do Filósofo Thomas Hobbes. Propôs Contrato Social para que houvesse coabitação regrada na sociedade. Em parte, estaremos a responder a importância da filosofia na sociedade. Para Bolsonaro, conforme sublinhei no texto anterior, a medicina e engenharia são cursos que têm resultados imediatos. O meu amigo baseou-se neste argumento e disse ainda que o facto de ter uma vida profissional frágil, é também devido à fragilidade da filosofia nos dias actuais. No mesmo dia em que publiquei o texto anterior, li um artigo no blog Tenacidade das Palavras. O autor, por sinal estudante de filosofia (Fernando Banze) argumentava que a filosofia visa, antes de tudo, humanizar a sociedade. Com o título: Decreto do fim das Faculdades de Filosofia e Sociologia: Uma análise da medida tomada por Jair Bolsonaro. O autor discute o tema de forma lúcida ao referir que o presidente do Brasil teve punho ao decretar o “fim" da filosofia e sociologia. Concordo.
O meu amigo disse que uns anos depois da independência de Moçambique, o governo também decidiu encerrar os cursos de filosofia e direito por quê? Questionou-me. A nostalgia do passado confunde as análises históricas. Afirmar que tudo que é passado foi bom e o presente é um abismo, é inadequado. Independentemente das circunstâncias políticas é preciso questionar as leis e as decisões de Estado. Esta foi a minha resposta. Todo governo, sem excepção, deseja controlar ideologicamente a sociedade que governa. Devia ter conversado com ele sobre os campos de reeducação. Os que lêem História ou têm parentes que foram vítimas desta medida do Estado moçambicano na década 1980, diriam inequivocamente que havia caça aos inimigos. Era proibido não concordar com as políticas Samorianas.
Por lado, encontramos o meu amigo cujas ideias filosóficas fluem como uma nascente. Mas o mar obriga as águas doces a configurar-se em águas salgadas. Apesar de ser um filósofo, para se integrar no mercado de trabalho tem de conhecer um trabalho mais técnico. No domingo, dia em que debatemos sobre Jair Bolsonaro, ele não falava como acadêmico. O tempo e os seus desafios coagem as pessoas a concordar com o inconveniente. Por último, temos Fernando Banze, também com ideias sólidas. Entretanto, apesar de estar ciente sobre as barreiras do mercado de trabalho, conhece a utilidade da ciência filosófica. Ambos têm um aspecto em comum: Estão desapontados com os ideiais que regem o mundo. Banze acredita no papel da filosofia enquanto que o meu amigo, de forma tímida diz que foi um erro crasso cursar filosofia.
Por Jorge Azevedo Zamba