O Poder da Sofia - VI

O Poder da Sofia - VI


Vivia de escrita jornalística e agora queria experienciar a carreira de escritor. Fui à  casa da Sofia pelas 7h da noite, não a avisei e fui mal recebido. A ideia de eliminação de fronteiras para convivência não incluía invasão de privacidade, principalmente, à noite.


Depois de um olhar de cão arrependido, ela recebeu o presente que ainda estava pendurado na minha mão, castanha de cajú. Demo-nos um beijo de reconciliação e caminhámos para a cozinha. Havia uma novidade na flat da Sofia, na cozinha e na casa de banho havia também um aparelho de som. Antes de perguntar ela disse-me que não sabia porquê. Mas não colocou no quarto porque ao dormir não precisa de som. E ao copular não precisa de excitação externa. 



O celular tocou, era a Hanifa. Receei em atender. Cancelei a chamada. A Sofia examinou-me e por fim perguntou - Namorada? Conversámos sobre mim e desaguamos no momento de sexo a três ocorrido noutra noite com as amigas. Confessei que gostara dos gemidos da Sara e que o rabo da Neide era um quadro de arte, mas não muito útil no acto. Rimo-nos e a Sofia comeu a castanha de cajú. Mastigou forte e cuspiu uma parte na palma da mão dizendo em simultâneo que a Neide gostou do meu espermatozóide e, por isso, engoliu-o. Levantei com mão direita no centro do peito e agachei meneando a cabeça para baixo por três vezes. Ela aproximou-se da lata de lixo e deixou escapar o exemplar de esperma. 



Cozinhei para Sofia enquanto ela lia poemas de José Craveirinha. Pela cozinha podia ouvir os delírios de leitura a embriagar o imaginário dela. Tirei o livro  e convidei-a para cozinha. Pediu que eu a servisse. Obedeci. Durante o jantar falámos do artigo da Hanifa e achei a discussão, um pouco vívida. A Sofia contrapôs o argumento da Hanifa sobre violência doméstica. A Hanifa tinha histórias e a Sofia tinha o histórico das histórias. Mas não aceitou fazer parte da matéria. Silenciou-me contra a parede e tirou uma gravata do seu bolso e amarrou-a no meu pescoço puxando-me para o quarto.



Era uma noite fria e os últimos acontecimentos também emergiam uma frieza comportamental. Pelo menos já não queria obedecer apenas o instinto. Queria um plano que me desse um caminho. Desabafei. A gravata ainda  estava no meu pescoço e foi usado para escapulir a frieza comportamental. Sob a actividade sexual sendo eu o dominado, respondi algumas perguntas impróprias para quem está a alimentar a esperança com base no coito. Ouvi - Amas a Hanifa? Cada resposta relutante era, para a Sofia, uma glória no acto. Não conseguia responder. Os nervos do raciocínio tinham sido colonizados pelo prazer. 



A Sofia não esperava que eu replicasse a nenhuma pergunta. Queria sentir-se no comando, queria dominar, não apenas como fêmea, mas como uma demostração da arte feminina. Para ela, a cópula deve ter um propósito cúmplice. Decidimos que faríamos juntos o trabalho dela. Precisávamos de um novo destino e de novas pessoas para mostrar paisagens. Agora perguntava-me de novo se eu amava Hanifa. Para Sofia, a Hanifa era uma pessoa normal e não devia se entregar ao meu mundo.


Frustrar-se-ia. A sua vida acabaria resumida no fracasso. A sociedade precisa da Hanifa e eu preciso de ti. - Disse a Sofia.


Por Jorge Azevedo Zamba

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