O Poder da Sofia - IV


O Poder da Sofia - III

(Leia o capitulo 3 AQUI)

Dormi em casa da Sofia com mais duas amigas. Chegaram pelas 10h da noite com um vinho para subornar a anfitriã. Nas conversas realizei que a jovem com quem tive um coito tem pós-graduação em Psicologia, mas trabalha como Guia Turístico. A melhor forma de curar as feridas emocionais, frustrações sociais e profissionais, etc, é discutindo sobre a vida com a luz de sol entre as nossas cabeças. Defendia uma das amigas da Sofia, também Psicóloga numa das organizações não governamentais. Falaram de suicídio em sociedade capitalista  e eu fui a cama para tirar os preservativos usados à vista.



A falta de paredes nos compartimentos da casa da Sofia já não causava estranheza às amigas. A Neide saiu da sala e foi trocar penso na casa de banho. Os nossos olhos esbarraram-se quando ela puxava as calças para cima. Sorriu discretamente e voltou à sala. Havia uma nota de suspense em meu semblante. Tinha vergonha de reparar mas a intuição evoluía para o sentido do sujeito-objecto. Voltei a mim e Sofia pediu que eu servisse o vinho enquanto ela preparava  o jantar. Não havia regras ou a regra era intuitiva e espontânea. A Sara tirou algo embrulhado da sua pasta e disse - É melhor que fumemos isto, primeiro. 



A Sofia era ateia, acreditava no ser humano e na sua capacidade cognitiva e de transformar. Depois de ficar embriagada dizia que a sociedade devia pensar como Karl Max e na cama agir como Charles Bukowski ou Truman Capote. A Neide era uma cristã cujos pais foram ateus e morreram de câncer. Ela diz que precisava de amparo e o ser humano não podia entender a sua dor. Converteu-se e acredita que há eventos ou factos que estão fora da razão humana. A resposta disso está na fé, no poder divino. A Sara era muçulmana liberal, já não frequentava a mesquita e não seguia  algumas orientações islâmicas. Mesmo assim, a união ali foi prova de um poder maior que qualquer fé ou religião.



Comer é fácil, suportar a saciabilidade é um acto de coragem - disse a Neide depois do jantar. Todos excedemos ao comer. Dávamos espaço à barriga e com os pés esticados. Livrámo-nos da dor trinta minutos depois. Eu, Neide e a Sara acreditávamos em Deus ou em Allah. Mas naquele dia tínhamos o poder próprio e que a divindade exclue dos mandamentos ou não está nas entrelinhas. O poder de vida estava presente nos nossos olhares. Não haveria crime senão uma prova de mais uma vida. Não haveria traumas senão para nos lembrar da nossa existência.


Por Jorge Azevedo Zamba

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