O Palestrante

O Palestrante
Foto/ dreamstime


A voz é tão polida e os cabelos assemelham-se com os de Lumumba. O palestrante concentra, de forma rotineira, um grupo de amigos que não têm/tiveram oportunidade de encarnar grandes intelectuais com base na oratória, uso de óculos de aparência académica e uma vestimenta que desafia a temperatura de países tropicais. Quis, com toda vênia, palestrar sobre o medo. Logo, veio um rapaz  com uma voz vibrante e gritou:
Mahindrooo. Os pés castigaram o chão emitindo uma corrida de fuga. Agora, confundia-se o palestrante a um velocista. As gargalhadas do rapaz puniam o pensamento de quase todos que aderiram à palestra. Pois, este assumiu que estava a brincar com os mais velhos, o que lhe valeu um carolho à mistura de avisos ameaçadores.

Voltou-se à conversa e o palestrante, convencido pelo próprio pensamento, usou o exemplo do rapaz que os interrompeu. Disse que há conceitos, fenômenos, entre outras coisas, que são sociais. O mesmo se sucede com o medo. A sociedade apelidou Mahindra como um alarme. Ou seja, a menção da marca de um automóvel, nesse contexto, significa que há/haverá escaramuças. Ninguém, a menos que, conheça um/a parente que o possa defender, se atreve a esperar pela chegada dessa viatura. Esmorecem os leões e qualquer sinal incômodo na linguagem policial é considerada como uma tentativa de assalto ao ar puro.

O palestrante, por uns segundos, foi reparando para os pés que quase deixaram o chão careca. Gesticulou, uma forma académica de demonstrar uma  robustez discursiva. De seguida rematou: O problema começa quando pensamos que a gritaria é a única via para impor autoridade. Sem grande salário,  arrastamos os pés que calçaram sapatos importados da Itália, Portugal ou mesmo da China. Mas quem se interessa? O medo neste país, amigos, tem parteiras, mas essas, infelizmente, não determinam o nível do amedrontar. Querem saber quem decide? São os pais do medo, eles, não conhecem a linguagem humana".

O palestrante, ao que tudo indica, já tinha medo de continuar a palestrar sobre o medo. As pessoas recolhiam-se para as suas casas. Mas continuavam com  uns murmúrios nos quintais. A sombra da noite tinha chegado. Os amigos estavam em seu bairro, na sua esquina, porém, a noite tinha tomado conta dos seus cérebros. Era o medo. De súbito, chegou uma viatura de marca Toyota Runnex e todos foram recolhidos às cenas. O palestrante não chorava e desta vez, usava uma linguagem diferente. Chamava aos policiais de chefes e com uma dose de perdão pela sua existência. Os seus amigos iam ficando desapontados porque esperavam por uma resposta jurídica. Por fim, todos foram soltos e o palestrante disse: " Sintam medo quando puderem, mas tenham inteligência contextual. Vivemos em Moz, bros" .

Por Jorge Azevedo Zamba

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