O (a)provador das filhas

O (a)provador das filhas
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— Phela Zinyani nzita heta hikuba, vasanwina! (Zinha, acabá-la-ei por bater, gente!)

— Uta nziba hayini?, nziyo kumahela yini? (Vai bater-me? Que lhe fiz?) — Os atritos entre as gerações ganhavam vida mais uma vez entre estas duas gerações seguidas. Na verdade, entre Zinha e Khandani, seu pai. As idades eram tão díspares. Khandani merecia ser avô desta. Era um homem forte, misto e com o corpo todo cheio de pintas pretas. Dizem que aquelas pintas eram sinal de vida longa, reza a história. Tinha, também, cabelos encaracolados e, quase sempre que estivesse em casa, andava de chinelos, cuja planta era de borracha de pneu, que já somavam duas décadas a serem arrastados pelas terras Tshwas, lá em Massinga.

— Wena Zinyani, zontle nziku rumako, hondzi yeyisa, hayini? (Tudo o que te ordeno não fazes, por quê?, por que me menosprezas?) 

— Nzoku yeyisa? (Menosprezo-lhe?)  Ulava nzivumela kubaya nawena mina? (Quer que eu aceite me envolver sexualmente consigo?) — Zinha dizia isto perante toda a vizinhança daquela vila, em voz alta, entretanto, todos sabiam que Khandani era assim. Sorte ou azar, só tinha filhas, nunca teve filhos homens com as cinco mulheres com que se envolvera. Das cinco, três abandonaram o lar quando souberam que o seu esposo se envolvera com as filhas. A quarta fugiu com a filha, após a comunidade contar-lhe das macabras atitudes deste, que era um grande (a)provador de suas filhas. Aliás, feito o vinho que, depois de passar por todo o processo e bem pronto para ir ao consumo, suas filhas deviam, igualmente, após atingirem a idade quinze, ser (a)provadas pelo seu ascendente.

Zinha, adolescente de dezasseis anos, já há um ano que era pelo seu pai tentado, mas, pela sua teimosia, via a sua virgindade ainda em dia e apenas ameaçada de término. Era órfã de mãe, pois a sua mãe morrera por cobrança dos antepassados de Khandani, cuja dívida crescia dia após dia e, para a sua desgraça, noutros moldes, queriam que a sua virgindade pagasse outros pecados deste homem. Era clara, formosa, alta, corpo de modelo. Os seus atributos eram capazes de parar toda a vila quando se dignasse desfilar por aqueles poucos quilómetros que albergavam as lojas, bancos, bancas e bombas de combustível e, claro, algumas instituições públicas como escolas, igrejas, procuradoria, esquadra entre outras. 

Diferentemente do pai, Zinha não tinha várias pintas pretas pelo corpo, senão uma, bem visível, como que carne afora, no céu exterior do lábio superior da boca, que realçava ainda mais a sua beleza. Era um charme! Se já com dezasseis anos era uma referência de beleza por aquela vila, não se imaginava como seria dali a mais dois, três ou quatro anos.

Era uma raridade, pois que, com aquela faixa etária, as meninas já eram mães de segunda e, por atraso de algumas, de primeira viagem. Mas Zinha estava ali, intacta, pura, porém em iminente perigo.

— Anzi hlayangi lezo (Não disse isso, eu).

— Ulava vazitiva vanhu zaku...? (Queres que as pessoas saibam que...)

— Néh (Não!) Aqui, meu pai, só fodo com um homem, o meu futuro marido! — selava aqueles dois lábios bem lubrificados de batom, carnudos, feito o traseiro da sua dona. Francamente, esta adolescente era mesmo apetitosa, linda, de deixar qualquer homem boquiaberto, mas nunca passaria pela minha cabeça que tal cobiça se estenderia até ao progenitor.

— Aqui não vais viver. Não gosto de filhas desobedientes.

— Nzita tsama, bem. I kaya kamina! (Viverei, sim, é minha casa aqui). — Sentenciava a pobre menina.

Khandani, como dizia, só gerava mulheres. Nenhum homem tinha trazido ao mundo e de todas, Zinha, a mais nova, é que nunca tinha passado pela sessão de (a)provação e, por isso, a única filha que poderia ter a chance de ir ao lar, fazer filhos, ser feliz como mulher, pois que, segundo os relatos da vizinhança, todas as suas filhas voltavam do lar, eram rejeitadas, maltratadas e levavam uma vida desgraçada, devido à tradição deste vil. Até a penúltima que fugira com a mãe, descobrira-se que escondera à mãe, mas tinha sofrido abuso. Khandani vendia a felicidade das filhas para saciar os seus apetites e ganhar mais forma, rejuvenescer.

A vila toda, na verdade, estava cansada de viver aquelas atrocidades, falta de escrúpulos e de ver aquele homem vivo, mas, por medo de suas acções, talvez pensassem que, mesmo morto, atormentaria as suas vidas, tanto que só anuíam com os seus actos.

Zinha mantinha-se firme na sua decisão. Já com dezoito anos, visitando às vezes a sua tia e, muitos dias vivendo com o pai, este que, mesmo com os seus maltratos, era bem tratado, cuidado, confeccionado os alimentos. Zinha decide contar ao pai que já tinha conhecido um namorado, mas o pai nem queria saber disso. Obviamente, porque todas as suas filhas, após por si serem violadas, praticamente se casavam com os seus espíritos e jamais tinham paz e felicidade. 

Zinha, porém, decidiu que, com ou sem o seu consentimento, a família do namorado iria, naquele mês de verão, apresentar-se à sua família, para tratar de seu noivado.

À madrugada, Zinha, trajada de um pijama rosa, cabeça de tranças xitrez, que ajudavam a segurar a peruca que, à hora de se deitar, foi tirada da cabeça para relaxar, sem cobertor algum, com uma perna mais para a cabeça, outra esticada, de costas, o telefone na zona da almofada, na sua mão direita, apanha sono, respondendo às mensagens do seu primeiro namorado, que se prometeram fazer um ao outro feliz.

Khandani, sorrateiramente, entra no quarto da filha, cuja porta estava semiaberta, destapa ainda mais o pouco pano de dormir da filha e põe-se a acoplar com a filha. Esta assusta-se, mas o acto já estava a acontecer, num momento em que esta sonhava na sua primeira noite com o namorado, quando, na verdade, o pai é que inaugurava aquele motor um ponto oito, na primeira pessoa.

Aos gritos, corre à sala. Sai à varanda. Vai ao quintal e, sem demora, a vizinhança já infestava a casa, numa procissão contínua.

— Zinyani, urilela yini, n'wananga? (Por que choras, Zinha?) — pelos rastos e porque sobejamente se sabia do que possivelmente teria acontecido, a comunidade só se pôs a baixar as cabeças e, quando se perguntava pelo paradeiro do pai, Zinha sequer tugia, pensava na sua virgindade, pensava na sua primeira noite com o amor da sua vida, pensava na desgraça que seria a sua vida dali em diante, aos prantos. 

Enquanto isso, alguns vizinhos, furiosos, decididos a golpearem até à morte o perpetrador daquela desgraça que há muito os enraivava, correm ao quarto de Khandani. O quarto estava na companhia da sua ausência. Outros foram ao quarto da Zinha que, aos gritos, chamam pelos outros. Khandani estava lá, golpeado pela morte, nu, tal como veio ao mundo, porém com pêlos por toda a zona proibida, deitado de costas, de olhos abertos e baba a lhe escorrer pelos limites da cavidade oral. Daquela mata de pêlos, só se via o pénis, todo erecto e grosso a crescer a cada segundo, quase a tocar as chapas e cuspindo algum líquido esbranquiçado e denso que quase inundava a cama da sua filha. 


Por Carlos da Graça 

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