1.
[...]
Sofre
língua do tempo
ajoelhada
nas mãos desta casa
feita de sal.
homens
tentam parar,
com rugas das unhas
o vôo das pedras.
suor deste poema
cambalhota
nas entrelinhas da luz.
silêncio é álcool
no alambique
do grito.
2.
[...]
Num
grão de sal
cabem todos olhos do mar.
nas
costas do sol
anda de rastos o azul do céu.
cega
a ave a carregar nos ombros
o ninho da água.
chove
um barco sem remo
das janelas
do rio.
3.
[...]
Pálidos
e tão reduzidos ao circo
os olhos deste vento
no fatigado céu
da água.
sombra
dum fino fio de búzios
abre todas janelas
dum silêncio
de sal.
4.
[...]
Ao Leví
Um exército
de camaleões fabrica o abismo
lá no tecto da casa
a andar lenta.
choram todas veias
da estrada.
o tempo move os braços
da poeira.
sangram os pés do destino.
larga
a sombra
do sol
ajoelha-se
no chão das mãos.
o vento
ainda passa redondo
pela face
do pranto.
o presente – o alto passo
da nuca
dos abutres.
ainda
voa a vermelha ave
a cortar o nariz
do vento.
o passado – o barco de barro
de pernas
arqueadas
a nadar
nas fundas avenidas
da água.
nas ondas
deitadas sobre a alta maré
flutua breve
o mundo.
o futuro – a lua em qualquer rua
a cantar
os olhos das estrelas
na coxa voz
do sol.
na terra
as líquidas afiadas facas
escrevem o sal
dos dias
em que a luz fecha os olhos.
na lâmina
do relógio
gira o corpo
dos rios – a rude canção
do sangue
a erguer
os braços
da pedra.
Sobre o autor: Britos Baptista, moçambicano, nascido no distrito de Mocuba, na província da Zambézia, em 29 de Março de 1992. É professor. É tradutor e Intérprete Ajuramentado de Francês/Português e Vice-versa. É licenciado pela UEM (Universidade Eduardo Mondlane). É escritor e poeta. É membro da AMOJOF (Associação Moçambicana dos Jovens Francófonos) e da AEZA (Associação dos Escritores da Zambézia). É Coordenador do Clube do Livro de Quelimane. Foi um dos vencedores do concurso de Poesia Desenha-me A Tua Liberdade, em 2016. Participou na Antologia Poética Melhores Novos Poetas Africanos, em 2016 e na colectânea de poesia Desenha-me A Tua Liberdade, no mesmo ano. Foi segundo classificado, no concurso de Poesia Printemps Des Poètes, em 2019. Participou na Coletânea de Prosa 19 cartas para a covid-19, organizada pela Xitende, e publicada pela Oleba Editores, em 2020.