Lágrimas de Palma - João Timane |
*Gritos de Palma*
O Zambeze nasce entre os olhos
A terra arde estéril ao baile das balas sem sonhos
Seu ventre se contorce na ganância dos homens
E mestrua mortes no discurso negro dos punhos.
E agora, Palma?
Que pecados cometemos?-- O sol de Junho morre aos bocados
Os tambores não mais gritam de alegria e com olhos abençoados
Talvez o tempo nos guarde e limpe as lágrimas da alma.
O coração dilacera-se, rios em crianças e mulheres nascem
Anunciando o evangelho do sofrimento
O que fazer para continuar? Vingaremos sua morte, mãe!
E agora, Palma?
Havemos de voltar a sonhar!
Pintar a terra e erguer a bandeira
Erguer a casa pintando poesia
Banhando de vozes e preces de paz sem afazia.
E agora, Palma?
*Rerum et philos*
À E. Jonas e as gêmeas
O relógio,
Entre as almas
Trabalha a paixão no ventre,
Segundos são sensualidades
Rios, mares a mergulhar
Tecendo os dias no brilho do olhar
No baile celestial pintando felicidades
Em suas vicissitudes e atitudes.
Talvez, o tempo, essa moradia das palavras
Permaneça errecto entre as almas
No pacto entre os céus, borboletas,rios e savanas
No cheiro suave do orvalho entre as planincies dos sonhos
Tecendo sonhos no aconchego dos lábios soletrando o coração.
Luxúria líquida
Ao Jonas Frederico
No olhar, lágrimas cheiram à pureza da verdade
Tão virgens quanto a luxúria política
Cujo habita e corre neste corpo feito mar
Vestindo abraços, beijos e carícias da vaidade.
O amor, às vezes, não é só a dois
Que se enche e desenha arco-íris entre a lua e o sol.
É como a arte de escrever, fiel a si e polissêmica
Porém, ciumenta aos olhos da terra.
É um risco, tão natural é habitual
Amar é como as borboletas, vaidosas
É um risco, tão cheio de vida e paixão
Viver, tecendo amores nas cores da luxúria do amor
Assim como o aroma da lua
Há no amor, borboletas ciumentas
Buscando abrigo na silêncio das palavras
Onde o poeta morre por seu único pecado [luxúria do amor]
SEGUNDOS NOSTÁLGICOS
À Sumbi Wa Mbate Jonasse
Em milhas de tempos
encostados no mar da nostalgia,
O coração descansa na dor
Construindo castelos aosolhos da solidão.
Nesse liquido instante, lua fétil de sonhos,
As rosas bailando à poesia
Guardando segredos como a velha palhota
Onde Deus escreveu um conto na primavera
Abortando a morte com os olhos sem quimera
Se esqueceu? -- é triste não lembrar, pensamentos engravidam seu nome.
Mãe,
há
no ciclo da água
A voz
que alimenta o amor
Brilhando ao sol sem temor
E escrevendo poesia líquida
Que teu abraço desconhece
Ao menos o vento reconhece.
Não te preocupes, mãe.
Como pássaro aparando Deus
Na varanda divina da lua
Onde espero-lhe todas as manhãs
Até que o sonho me lembre
Esquecer-me-ei destes segundos nostálgicos.
POESIA AFROCÊNTRICA
Nuvens laranjas e outras viúvas
A voz do mar pintando o horizonte,
Entre o véu e as ondas lê-se a paz da savana
Devagar me Entre lanço
Caminhando lado a lado com o sol e lanço anzóis ao mar
Alimentados pela esperança da poesia no sonho africano em um abraço
Eu não sou da África, sou africano.
África é cheia de incansáveis sonhos ancorados no sol nascente de um poeta
Como a esperança que habita no ventre do tempo longe dos deuses.
Amo essa gente cheia de amores de passarinhos
Temperada com beijo da terra floresbrotando sorrisos sem era
Na voz da afrocentricidade fixa no sonho milionário da liberdade.
Deve haver um segredo mas mãos dos deuses,
O sabor paradisíaco da afrocentricidade
Terra, Savana, Rio, Perfume e alma. Ahm, o sonho!
Se fazem no olho da poesia na tela do escritor
Afinal África nasce e morre, corre e voa em mim
Antecede a experiência se harmonizando no corpo celeste da palavra.
— Que safadinha Minh ‘África! — Poesia se escondendo no ventre do tempo
Nela, caminho eternamente como na linguagem esculpindo almas na voz da passagem.
CONVERSANDO COM OS MORTOS
Que infortúnio, o peso que me ampara!
Às vezes, pensa-se que a morte é uma sorte,
Outras uma vírgula temporal ou indisciplina dos xikwembos.
— Pois é, mãe! — A terra avermelha-se e os nossos aplaudem
E os olhos se excitan orando em desdém.
— Há sentido algum em existir, ao menos nesta terra?
Sabe-se aqui ou lá! Talvez o mar, o tempo, quiçá as balas sem ética
Porém, seu sonho de avó desconhece minha métrica e estética.
Mãe, onde estiver. Diga-me sem pestanejar, vê a cor dos meus olhos?
Ou a chama que arde nesta alma tentado ser poesia, ao menos como água.
Mãe, sorria na glória, guardando versos e memórias
De um sol nascido do teu ventre, ao menos de tantas mortes permanece erecto
Na cor universal de um só-neto sem teto caminhando entre os angulos das almas.
— Ó mãe, entre batuques e pincéis, olhares e luas, vingarei sua ausência.
DULCIS ODYSEA
Ao irmão Gadinho, poeta dos passarinhos
Entre a voz e o mar
Constrói meu poema seu lar
Esperando a vingança da lua ao se casar
No suave beijo do sol e o mar
Para parir filopoetas e filopintores da alma
Ou terapeutas tecendo ninhos no altar.
— Que doce alma tem os lábios e os olhos do sol!
Cada verso que se compõe é um sonhar de África
Abraçando a humanidade no brilho da borboleta.
Minha alma mora num poema
Nasce e more na terra acolhendo almas
Como a África acolheu-me com minha imperfeição
Doando sua moradia aos devaneios de uma paixão.
Sobre o autor:
Hélio Zildo M. Guerra, cujo pseudónimo é Hélio Zyld Guerra nasceu em uma manhã de domingo, ao décimo quinto dia do oitavo mês de 1993 no Bairro da Matola G, Município da Cidade da Matola. É licenciado em Filosofia pela Universidade Eduardo Mondlane (2012-2016) com especial destaque para o tema do seu trabalho de fim de curso:“ Progresso do conhecimento científico segundo Gaston Bachelard”. É escritor, filosofo, poeta, pesquisador, professor, palestrante, académico representante da Academia Internacional União Cultural e muitíssimo apaixonado pelas belíssimas praias do nosso país. Prémio de 1º l lugar no 1º Concurso de Poesia Livre ARLACS 2021 na categoria de académico correspondente. Publicou artigos de opinião no jornal Zambeze, em seu blogue (www.heliozyldguerra.blogspot.com.), e em Tenacidade das Palavras sobre a humanidade e outros assuntos ligados a sociedade. É autor da obra “Poesia Líquida” publicada pela Editora Kulera; “Sensualidade 21” publicado pela Dahavea Editores; e coautor de “Activisionismo: um ensaio em volta da reconstrução social” publicação independente. Actualmente reside em Maputo onde continua produzindo e participando de grupos ligados a literatura. Contatos: Heliozildo@hotmail.com ou pelo www.facebook.com/heliozyldguerra. Em tempos livres, lê, medita, escreve, caminha pela natureza.