Créditos da imagem aqui
por: Poeta Levianno
Num domingo como hoje, deve ter sido
lá para 2013, saí 13h de casa. Ia a uma reunião que estava marcada para 14h.
Não me recordo como estava vestido e outros detalhes, só sei que tinha uma
reunião. Nem me recordo da agenda mas sei que tínhamos ideias por discutir a
fim de pôr o movimento de artes e
cultura “a Fénix” em dia. O presidente do movimento era o meu amigo Norek-Red. Entre vários sítios,
optamos por nos encontrar no jardim da Liberdade vulgo jardim dos
''Madjermanes''. Era estratégico encontrarm-noss lá tendo em conta os nossos
locais de residência.
Lembro que na reunião estava o Arquipoeta,
Euclides da Flora, o Mauro da Silva, Andrades Cossa, o próprio Norek, Daúde
Amade e outros novos ingressos ao movimento. Mas não é sobre o movimento que venho aqui falar. O que quero trazer é o que aconteceu depois da reunião.
Tendo sido dado por terminado o encontro. Tiramos algumas fotos como de costume
e depois saí às pressas. Tinha que comprar presente para alguém muitissimo
especial para mim. A tal pessoa completava anos naquele domingo, 17 de janeiro.
Saí por trás do jardim. Fui em direcção
à paragem Belita na Av. Eduardo Mondlane. Ali ficam indivíduos que trocam
diferentes artigos por dinheiro. De início estava indeciso no que comprar.
- Boa tarde, mano!
- Boa tarde.
Fui observando os vários produtos a venda.
- Quero relógio para alguém que está a
completar anos – disse.
- Ok! É homem ou mulher?
- É homem...
- Tem estes aqui, os preços variam do
primeiro mundo ao terceiro mundo, aqui deste lado são mais baratos, os preços
variam da praia da Costa do sol à Bilene.
Acabei optando por comprar um relógio
como presente. Escolhi o que achei melhor.
- Tenho ali papel de embrulho vou-te
fazer barrato, boss!
- Não, não precisa!
Paguei o relógio. Acertei as horas
andando. Enquanto atravessava a Av. Eduardo Mondlane em direcção a casa, punha
o relógio no meu pulso. Essa foi a primeira vez que me ofereci um presente.
Qual foi a tua última vez?
Ali não houve falatórios embrulhados
naqueles discursos cheios de mel, não houve ornamentação nem festa surpresa,
não houve palmas, ninguém cantou parabens, não houve balões, bolo e nem havia
gente: amigos, família etc. Eu estava a atravessar a estrada, sozinho, quando
recebi de mim para mim aquele presente.
No passeio estava gente desconhecida que nem
sabia que na estrada, no meio, estava a
acontecer uma entrega de presente e nem sabia que havia uma grande festa no
coração de alguém. Os carros vinham normalmente. Semáforos faziam a dança das
cores naturalmente. Os pássaros batiam as asas como a engenharia divina manda e
sempre mandou. As buzinas punham-se a
gritar sem pedir a palavra, com o ego obeso de razão, como sempre, escondidos
no álibi de despertar os sonâmbulos no meio da estrada.
Vendo por outro prisma, se calhar
aquela avenida representava a estrada da minha vida. Os carros, perigos que
tenho que contornar na vida. O presente, a vida, já que era um relógio. Dizem
que relógio é o castelo guardião do tempo, nem? Pessoas desconhecidas no
passeio, talvez representassem gente que
nos rodeia que muitas vezes chega a ser estranha. Em fim, naquele dia recebi um
presente de mim para mim mesmo. Qual foi a tua última vez?
Às vezes não temos que esperar nada de
ninguém. Há coisas que só nós mesmos podemos dar a nós e mais ninguém pode
dar-nos: felicidade, é uma delas. Não que ninguém pudesse me dar um relógio, mas
o sentimento de dar algo a alguém especial e esse alguém seres tu mesmo é
único, incomparável. Podemos receber
"n" presentes mas a coisa certa só nós podemos nos presentear. E a
questão não está no presente, o relógio se calhar não fosse o que eu estivesse
a precisar no momento, mas o gesto em si, de mim para mim, leva à outras
emoções. Qual foi a tua última vez?
Naquele dia ofereci-me um presente. Aquilo foi
emocionante. Nunca tinha me oferecido nada num aniversário em toda minha vida.
Fico com o coração apertado quando vejo gente triste porque as pessoas esqueceram-se
delas, mas o pior de tudo isso é notar que elas próprias esqueceram delas
mesmas. Quando mais ninguém lembrar-se de si, existes tu. Qual foi a última vez
que te ofereceste um presente?
Já agora, deixa-me desejar-me um feliz
aniversário, hoje, domingo, 17 de Janeiro. Felicidades, sucessos e muita saúde
para mim. Se Deus quiser, que eu viva o suficiente para oferecer-me mais presentes.
Mais felicidade.
Sobre o autor: Poeta Levianno, de seu nome de registo Silmério Silvestre Uaquessa, nasceu na cidade de
Lichinga, província de Niassa, em Moçambique. Licenciou-se em Sociologia pela
Universidade Eduardo Mondlane. Co-autor da Antologia de Poesia "Desenha-me
a tua liberdade (2016)", promovida pelo Centro Cultural Franco-Moçambicano
(CCFM) e Instituto Cultural Moçambique - Alemanha (ICMA), e da Antologia de
Contos Criminais Moçambicanos intitulada "O Hamburguer Que Matou Jorge
(2017)", editada e publicada pela Ethale Publishing Lda., em Moçambique e
no Reino Unido.