Mano, eu não sou Jesus



Mano, eu não sou Jesus tenacidade das palavras
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Há anos que as nossas selecções de desporto perseguem os lugares de destaque nos rankings mundiais. Indubitavelmente que em modalidades como o “Tank Soo Do”, salto à corda, basquetebol feminino, voleibol em ambos os sexos, hóquei em patins, temos demonstrado muito músculo, isso sem falar das ilhas que temos e da terceira maior baía do mundo que pousa na pérola do índico.
Podemos-nos orgulhar desses e de outros mais brilhos que refulgem a nossa pátria no mundo. Contudo, nesta corrida pelos rankings, acabamos por cair na armadilha montada pelas classificações negativas, um exemplo claro é a classificação feita em 2008 pela forbes.com, na qual Maputo é a vigésima terceira cidade mais suja do mundo. Há quem defenda que daqueles tempos até os actuais, pouco terá mudado, antes pelo contrário, teremos aprimorado o dom de ornamentar Maputo com resíduos.

Não precisa sequer piscar o olho para ver o esmero e a naturalidade com que alcatroamos a cidade com vasilhames, plásticos, alumínio, papel, etc. As cascas de banana servem de patins para os distraídos; os meninos não se conseguem deliciar do “chingufpu” à vontade para não sentir o sabor dos grãos de garrafas plantados e regados à mijadas nos nossos areais; Nos nossos “chapas” não mais se vêem os tapetes, aliás, há tapetes de respingos de amendoim: uma obra de arte sem igual! Ainda os “chapas” assim como as viaturas particulares abdicam do ar-condicionado por uns instantes só para que as janelas vomitem descartáveis e lixo variado.

A verdade é que para nós já não faz diferença conservar ou não as nossas casas, as nossas ruas, a nossa província. Deitar o lixo na rua tornou-se algo absolutamente normal, não importa se é na estrada ou na rua, sentimos que temos que deitar o nosso lixo onde nos apetece. Não me surpreenderei se daqui a alguns meses organizarmo-nos para pedir que conste da nossa legislação deitar lixo em qualquer lugar.



Foi frustrada a tentativa de pôr contentores de lixo, aliás, foi uma afronta para aqueles que defendem a teoria de que o lixo é nómada. Pois é, responderam à altura, isso porque mesmo vendo o contentor vazio ou semi-saciado, teimam em deixar o lixo fora dos contentores, neste momento o nosso Jorge Matavele diria “quem é você para negar moradia ao lixo?”.

Por outro lado, não podemos negar que há famílias, lá nos nossos bairros mudos, que abrem covas para fazer o funeral do lixo, têm os quintais cada vez mais desgraçados, em que trimestralmente têm de abrir duas covas: uma para a latrina e a outra para o lixo. Já sem espaço para duas, corremos o risco de ter covas híbridas e polivalentes para as duas finalidades referenciadas. Os contentores-vagalume que têm, são barrigas cheias que não fazem digestão, mas no final do dia pagam conforngados uma taxa de lixo.

Em todo o caso, o que está aqui em causa é a veemência e a mestria com que, sem nenhum desconforto, fazemos o nosso lixo beijar esta terra. Desde o bocado de rebuçado aos sacos obesos, é tudo lixo. Pensamos sempre que não somos nós os culpados, mas quem começou. Eu disse, então, a uma senhora na Malanga para não deitar lixo no chão ou num local inapropriado, porque se ela continuasse, mais teorizadores da causa lixo nómada apareceriam para perpetuar a congregação e nunca mais parávamos e ela respondeu-me:
- Mano, eu não sou Jesus.
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Por Jaime Bonga
Fernando Absalão Chaúque

Professor, escritor, poeta e blogueiro. Licenciado em Ensino da Lingua Inglesa. Autor de ''Âncora no ventre do tempo'' (2019) e co-autor de ''Barca Oblonga'' (2022).

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