6 Poemas para Visitar o Íntimo de Edson António

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1. Paz

Em meio ao sossego
escuto  ruídos
e barulhos que não ouço
em meio à desordem...

Escuto o gemer das trevas
quando a minha alma
quebra os ferrolhos
e permite que o fulgor
peregrine pelo meu íntimo.

Então
alegram-se os meus olhos
que vinham sem vigor
e cansados de chorar o meu próprio luto.

E
antes da chegar-me o fulgor,
não percebia a vida no meu íntimo,
que borbulhava nas trevas.


2. Cidadão incomum

Quando nasci, já cá estava
Sem que eu lhe conheça,
De mim já esperava…
Antes mesmo do meu choro anunciar
a minha nascença!

Você recebeu-me tão feliz,
Pois punha em mim esperança
Mas cedo lhe fiz perder confiança
Pois segui perdido e infeliz.

Porém hoje, quero reatar a amizade,
Cultivar a igualdade, essa realidade,
E amar ao próximo como prioridade.

Oh mãe Sociedade!
Quero ser legal,
E não como ratazana do canavial.

3. QUATRO DÉCADAS APÓS ATINGIR A MENOPAUSA
EIS QUE A MINHA VELHA MENSTRUA

Sempre fui ligado à minha velha.
Afinal, aprecio ouvir suas adoráveis histórias:
algumas sobre a guerra, outras sobre o colonialismo
e fortes aventuras passadas na sua juventude,
que até tiram-lhe a essência de velha!

Minha velha fala da guerra com muito pesar
Mas, revela nostalgia ao falar da escravidão :
"éramos animais pacatos dominados por homens selvanges,
trabalhávamos como aves, que voam sem ter onde pousar
contudo, cria em pousar  num galho, que seria o fim da servidão."

Mas, ultimamente minha velha anda estranha,
perdeu vigor e parece cheia de tédio,
chegando a se parecer com uma égua prenha!


Será pelas marcas deixadas pela guerra?
Época em que as lágrimas, o sangue e nem a morte,
eram capazes de despertar o amor
dos homens do Império vil e colonizadores.
Era assim no Sul, Centro e no Norte,
Seres pacato, destinava-te a sofreres.

Não! o pranto da minha velha não vem da guerra,
era do fascismo português e nem da chicotada .
Pois, para ela as  cenas da guerra,
não foram tão deploráveis quanto ser violada
e engravidada pelo seu próprio filho!
Infortúnio este, que não tirou dela a virgindade,
Mas sim, o sossego em plena menopausa!

É preciso abortar, senão ela morrerá!
Se não abortar, a minha velha morrerá!

É precisa abortar a corrupção,
que fluí sem contemplação!
Abortar a extensão dos impostos,
que pelo peso, são injustos!
Abortar a tão tóxica dívida,
que de rebeldia é possuída!
Abortar os salários minúsculos,
que são fixados sem escrúpulos...


É preciso abortar, senão ela morrerá.
Se não abortar, a minha velha morrerá!

Mas como sobreviverá a minha velha,
se mesmo grávida, ainda é violada?
se somos hoje, o colono de nós mesmos e
opressores na nossa própria escravidão?
Em  que te refugiarás ó velha pátria amada!?

É preciso abortar, senão ela morrerá!
Se não abortar, a minha velha morrerá!

Como se salvará a minha velha pátria amada,
se pedra à pedra destroem seus belos dias?
Se milhões de braços em uma só força,
ofuscam o teu esplendor em discórdias?
Até quando resistirá a minha velha Moçambique?

É abortar, senão ela morrerá!
Se não abortar, a minha velha morrerá!

4. IMPORTA AMAR

Não importa,
pode deixar aberta
a porta.

Não importa,
pode entrar, está segura aqui.
Tal qual num barco,
que de noite aporta!

Não importa
a dureza da  madeira
da minha cadeira.
Senta no meu colo e
abraça-me encoberta...

Não  importa
que nada diga pela boca;
ouvir-se-á nas ondas do meu respirar
a poesia em cuja toda solidão sufoca.

Não importa
a idade das tua mágoas;
dá-me sua mão e  alie-se à esse sentimento,
que para felicidade nos transporta.

Não importa
o acontecimento,
envolva-se neste sentimento
e viaje comigo no momento,
até paraísos em que só Amar importa.

5. A FORÇA

Sentado no quarto,
eu escutava a voz do silêncio
que soava como nada!

Enquanto
lia a última página
de Vozes Anoitecidas,
onde nada estava escrito

E
para não ter que
ver sair da minha boca,
o meu lúgubre coração,
eu não falava nada

Até que
uma gota de água,
que verteu da torneira
e caiu na pia de louça suja
da cozinha,
expeliu o silêncio
daquela triste noite.

6. SEM FINGIMENTO

Tu estás sempre aí,
Inquieta, a vigiar,
Esperando ouvir de mim um ai
Para então atacar!

Tu és uma companhia vil,
Porém amiga da verdade,
quando te ignoro por vaidade,
És capaz de levar-me à um escuro covil.

Tu és um Atalaia de muita paciência,
tanto que assistes todos os meus devaneios
E a cada um, julgas sem clemência.

Tu és a consciência…
A minha sã consciência,
um verdadeiro tribunal em meu íntimo,
que nada lhe corrompe,
nem mesmo a ignorância .


Notas sobre o autor
Edson Samuel António, é um jovem poeta de nacionalidade moçambicana, nado a 03 de Fevereiro de 1997, na cidade de Maxixe, província de Inhambane. Entretanto, a partir de 2004 mudou-se com os pais e passando a viver na cidade de Maputo até hoje.
É estudante de letras, Literatura Moçambicana, na Universidade Eduardo Mondlane. Nas suas paixões, além da escrita, tem a música em si. É membro da Escola de Música Clássica em Maputo, Xiquitsi.
O gosto pela escrita, com enfoque na escrita poética, conta-nos que lhe surgiu na infância, foi nas aulas de português que encontrou em contacto com os primeiros textos e começou a fazer pequenas apresentações em eventos escolares.
Hoje, sem nenhuma obra publicada, apenas textos soltos, trabalha gradativamente em duas obras, sendo um romance intitulado Cosse – a morte que não doeu e um de poesias intitulado Fome.

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