NHEMBETY



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Nhembety foi a banana que fez a rendição de turno com a sua bananeira Mavasse em Chichuco, Magude, e a sua maternidade foi um canavial num dos lábios de um dos afluentes do misterioso Incomati. Era filha única do lado materno pois Muridjy seu pai biológico havia engravidado até as suas próprias primas, por isso o Mukulu desconfiava dele e dizia, em conversas banais, que não ficaria surpreso se uma das suas vacas parisse um bezerro com a cara de Muridjy. 

Foi criada como filha pela gémea de Mevasse, Khatazy esposa do Ricotso, um respeitado agricultor que todas as tardes se fazia presente na vila de Magude onde vendia a grosso no mercado local diversos legumes da sua machamba. Era dono e proprietário de tractores e charruas, com as quais trabalhava a terra. Além de trabalhador Ricotso era um viciado em jogos de azar e era numa das mansões do emergente bairro de Aviação onde perdia as suas tardes no jogo e só regressava a sua localidade no final do dia, com o fito de recarregar as suas baterias para as labutas subsequentes. 


Nhembety não conhecia a mãe nem por fotografias, mesmo se a defunta lhe visitasse em sonhos não a reconheceria, mas, em contrapartida, a Khatazy era cara da Mevasse, por isso sempre que saíssem juntas todo o mundo dizia são lindas e parecidas. Durante a sua infância ajudou nas actividades domésticas e até frequentou a escola primária local, onde concluiu o ensino elementar, sem nunca ter deliciado o sabor amargo da reprovação e nas classes com exame ela foi sempre dispensada pois as suas médias roçavam a nota máxima vinte. 

Nhembety era linda, e por onde passasse chamava a atenção aos transeuntes, que o diga o Professor de Educação Física, Chobela que nas suas aulas contemplava aquela obra-prima de relevo disposto em forma de escadaria, desde os traseiros fartos, seios excitados, barriga sem banhas, ancas traiçoeiras naquela inocente avenida de rosto angelical e um sorriso comprometedor. Depois de concluir o primário, a direcção da escola viu se obrigada a envia-la para a escola agrária de Magude, devido a sua idade avançada o que deveu-se ao facto de ter sentado pela primeira vez numa sala de aulas já com os seus onze anos de idade e quando recebeu a notícia regressou a casa feliz para dar a boa nova a família, ao que Ricotso refutou. 

Khatazy e Nhembety, primeiro entreolharam se, depois aproximaram-se, abraçaram-se e do rosto da Nhembety deslizaram lágrimas, que alagaram os corpos grudados. O rosto da Nhembety mesmo banhado de lágrimas continuava lindo, aquele rosto não sabia ficar feio. Com a ajuda do Mukulu a direcção da escola e claro o Professor Chobela tentou sem sucessos convencer Ricotso a autorizar a sobrinha a continuar com os seus estudos, mas Ricotso empancou igual aos seus burros quando sentem o cheiro do perigo. 


No caminho de volta, Chobela jurava de pés juntos que ia tirar o amor da sua vida das mãos do tirano, e proporcionar-lhe uma vida melhor. Ricotso escorraçava todo o rapaz que se aproximasse da Nhambety, alegando que os rapazes eram perigosos, enquanto ela era ainda inocente e inofensiva e, por isso, preocupava-se e bastante com ela e por essa razão não permitiu a sua ida a Escola Agrária, onde havia lobos com pele de cordeiros que simulavam transmitir conhecimentos para a posteriori abocanhar as suas presas. Ricotso ia mais longe e ao extremo de recordar a Nhembety sobre as suas origens e que não queria que ela tivesse a mesma sorte a da mãe, de terminar nos braços de um malandro, palavras que comoveram a rapariga. Mas verdade verdadeira o homem estava rendido aos encantos da sobrinha, desejava-a, masturbava-se só de possui-la em pensamentos, assediava-a, fazendo-a agrados e promessas. 

O tempo passava e Ricotso ia erguendo o castelo de areia em seu peito, naquele lar a harmonia residia sobre uma pólvora, era uma paz minada. A verdade veio a tona quando a Khatazy teve que viajar a Xinavane para assistir ao casamento duma prima do seu esposo e o Malandro não foi alegando ter muitas encomendas para levar a feira que tem havido aos domingos cedo na Estação dos Caminhos de Ferro em Magude e a esposa deixou as rédeas da casa por conta da sobrinha. Partiu confiante que o seu digníssimo esposo estaria em boas mãos. O Plano do Ricotso saiu melhor que a encomenda. Naquele sábado saiu bem cedo no seu Toyota Town Ace, despediu a esposa com um beijo agridoce na terminal dos semi-colectivos de Magude e deslizou para o Mercado e, logo depois da venda, pela primeira vez, não se fez presente nos jogos de azar, o que provocou estranheza aos seus adversários. 

Entrou na loja do já falecido velho Chongue onde comprou refrigerantes e um vinho qualquer, passou da Macol onde comprou pão e algumas roupas e carregou alguns passageiros residentes em Chichuco que faziam as suas compras para o seu consumo e posterior revenda na comunidade, só assim evitavam ir a vila aos domingos. Quando a Nhembety viu o tio a chegar, apressou-se em preparar a água para o banho e o almoço e para o seu espanto, logo depois do banho, ele chamou-a para o quarto e o sem vergonha estava apenas de toalha, sentado na cama pediu-a para que lhe cortasse as unhas, o que ela estranhou. Mas ele apelou ao mesmo tempo que reclamava a falta da atenção por parte da sua esposa o que lhe tornava um homem carente, enquanto acariciava o seu cabelo e como quem não quer nada, pegou as suas mãos e puxou-a para si e beijou-a. 


Desesperada tentou sem sucessos defender-se do predador e num ápice, estava na cama dos tios. Com toda a sua força Ricotso rasgou as suas vestimentas, enquanto a inocente chorava, chupou aqueles seios excitados que tinham o mesmo sabor de quando chupou-os no poder da sua imaginação. Enfiou o seu enorme dedo de agricultor na fruta da Nhembety e lágrimas de dor e raiva banharam os lençóis e a face da inocente donzela e nisto Ricotso triunfante como o atleta cortando a meta, penetrou o seu pau-preto, enorme e rijo na intimidade da sua presa que foi recebido com um grito imediatamente frustrado pela enorme mão do sacana que tapou a sua boca ao mesmo tempo que nos seus ouvidos sussurrava palavras que a Nhembety teimava em não ouvir. 

Consumado o acto, Ricotso puxou-a mas sem a mesma força e vigor com que a puxara antes do seu acto humanamente desumano, ao que ela declinou sem palavras mas sim por actos. Saiu do quarto abandonando-a prostrada e inconsolável e sem noção do tempo e espaço. Nhembety lembrou da mãe que não conheceu, do pai que não assumiu-a, sentiu-se suja, rogou a Deus para que lhe levasse para junto da mãe, na qual pelo menos uma vez poderia chorar e desabafar as suas frustrações e inquietações e naquele instante percebeu a razão do Ricotso ter tirado todos os seus pretendentes e de ter ameaçado constantemente e sem justa causa o Professor Chobela, aquele mesmo que manuseava o seu corpo com delicadeza nas aulas de Educação Física. 

Triste acabou embarcando nas asas do sono enquanto ele almoçava orgulhosamente após a sua feliz investida, e pela primeira vez havia trocado as suas jogatas por uma causa justa. Quando regressou ao quarto encontrou a sobrinha na mesma posição que havia a deixado, cobriu-a o lençol que testemunhou a sua sacanagem, entrou na sala abriu o seu vinho, encheu o copo, brindou com o Diabo e sorveu o com gosto. O dia já fazia rendição do turno com a noite. Pela primeira vez colocou uma bacia de água na casa de banho, ganhou coragem, acordou a sobrinha e apelou-a para que fizesse o banho ao que ela não o ligou, insistiu e ela olhou-o com desprezo, mesmo assim reergueu-se e foi ao banho onde demorou, deixando-o preocupado. 


Saiu do banho e anichou-se no seu quarto, uma palhota que se encontrava bem distante da casa principal e bem ao lado do curral. Encostou a porta e ainda de toalha atirou-se no xikolokolo. Ricotso chegou no quarto da menina onde havia uma vela acesa e Nhembety não se recompôs, olhou-a e deu-lhe vontade de binar, mas apenas comeu a com os olhos enquanto o seu pau-preto salivava de desejo em sua garagem e mesmo assim conteve-se e de joelhos pediu desculpas com lágrimas de crocodilo nos olhos, entregou-a um plástico que continha roupas que comprou na vila, desde roupas interiores, exteriores e uma garrafa de dois litros de refrigerante. Apelou para que ela não contasse o sucedido a Tia e disse que não sabia porque aconteceu daquele jeito, pois ele tem planos de tê-la como segunda esposa. Era tudo papo furado, queria apenas saciar os seus apetites sexuais. Aquelas palavras provocaram náuseas a Nhembety que com gestos pediu para que ele saísse, pedido atendido imediatamente. 

Na manhã seguinte dirigiu-se a feira na estação, onde fez as suas vendas e ligou para a esposa e combinaram a hora da partida da vila para Chichuco, e quando esta perguntou sobre a saúde da sobrinha Ricotso garantiu que a Nhembety vendia saúde e num tom irónico disse relaxa mulher. No jogo tudo ia de vento em pompa e Ricotso era quase que sempre o vencedor. Saiu do bairro de Aviação sorridente pois tinha o mundo aos seus pés, encontrou a esposa e regressaram às origens. Em Chichuco, Nhembety matutava em seus pensamentos, entre contar tudo a tia ou fugir de casa. Mas para onde? A mãe faz tempo que embeleza o jardim dos mudos no além, quanto ao seu pai só sabia que trabalhava nas minas, também não ia adiantar pois nunca a assumiu e como se não bastasse seria a sua palavra contra a do Ricotso e, então, em quem iriam acreditar? 
Fez pacto com o silêncio e sofreu calada. Jurou que contaria a mãe logo após a sua chegada ao paraíso. A noite já humilhava o dia quando Nhembety reconheceu a voz do Town Ace, a milhas de distância. Deixou cada coisa no seu devido lugar, recolheu-se no seu palácio e atirou-se no seu Xikolokolo. 

A Vida seguia o seu rumo e a Nhembety seguia o rumo da vida, a tia notou que no jardim da face de Nhembety, as flores já haviam murchado e fazia muito tempo que o rouxinol do seu cantar havia dado luz a um silêncio ensurdecedor. 


Abordou a sobrinha procurando saber o que andava errado mas debalde. As lágrimas da Nhembety não derramaram em vão, Ricotso começou a perder constantemente nos seus jogos e alguns projectos ligados a Açucareira de Xinavane começavam a usurpar-lhes as terras férteis por alguns trocados e a estiagem estava no seu auge. De vencedor a perdedor começou a apostar com os seus bens, começou por algumas cabeças de gado e entre vitórias e derrotas perdeu as charruas e acabou perdendo o tractor à revelia da esposa. A vida de Ricotso ia de mal a pior e nisto Chobela que já era Director de umas das Escolas da vila e nunca perdera de vista os passos da Nhembety, aproximou-se da família com o intuito de formalizar a sua intenção para com a Nhembety junto da família.

Ricotso já impotente deu a mão à palmatória e o sorriso voltava a ser a sala de visitas daquela criatura de Deus. Enquanto isso, Ricotso continuava nas suas jogatas e acabou perdendo o seu Town Ace e acabou sozinho na vida quando passou pelo bairro de Aviação e vendo os seus comparsas tentou sem sucesso usar como objecto de troca a sua belíssima esposa Khatazy. Enfurecida ao descobrir o que arruinou-os, separou-se do sacana e foi prontamente acolhida pelo casal Chobela e hoje zela pelas gémeas do casal homenageadas com os nomes de Mevasse e Khatazy. Enquanto isso Ricotso andou a deriva e sobrevivendo com os míseros tostões dos contractos de terra, suas jogatas, copos e envolvimento com viúvas carentes e, deste modo, acabou transformando-se num autentico Madhaya Nhoca. 


Minyetani Khossa

GLOSSÁRIO

Nhembety – Lágrima.

Xikolokolo – cama fixa, enterrada no quarto e que está sempre na mesma posição e feita de troncos de arvores e folhas de palmeiras.

Madhaya Nhoca – indivíduo desempregado, sem esposa, pronto a fazer qualquer biscate e sempre solicitado pelas mulheres solteiras e viúvas. É um faz-tudo que apaga o fogo das saias e faz outros trabalhos domésticos.

Mukhulu – régulo ou espécie de Rei-menor.

N.E.: Estes vocábulos e expressões que constam do glossário são usados nas línguas locais do sul do rio Save em Moçambique.

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