Vidro
Rasgado - Capítulo 1
Vidro Rasgado |
Olhou
os verdes olhos do parceiro com o semblante murcho e mil pensares invadiram-lhe
a consciência, mas preferiu seleccionar as palavras que julgava convenientes e pôs-se a desata-las:
- Acho que
chegou o fim...
Antes
que terminasse sua fala, uma lágrima escorria no rosto do parceiro lavando-lhe
o semblante que há muito precisava
duma purificação. Aquelas palavras despertaram um sentimento até então
desconhecido ou escondido no coração do parceiro. Seus olhos se cruzaram e no
silêncio dos discursos disseram quase tudo, apenas deixando que cada um
interpretasse aquele vazio do discurso.
- A decisão não
pode ser revogada? - Perguntou ao parceiro, esperançoso
que não ia perder aquele que o tinha por companheiro das longas jornadas do
labor.
- Infelizmente
essa decisão não depende de mim, são ordens superiores.
A
chuva salgada se intensificou no rosto do parceiro inundando a esperança
patente nos seus olhos, o límpido líquido tomou conta do cenário facial do
Quím. E o parceiro se compadeceu com as emoções daquele que o tinha não só como
colega de profissão mas como irmão.
- Não chore por
mim companheiro, não mereço tuas lágrimas. -
Dramatizou.
Em
meio aquele momento que parecia uma despedida, as dúvidas e curiosidades
corroíam a consciência do Quím. No entendimento dele, seu companheiro era um
polícia exemplar para corporação, o que teria ditado o seu afastamento?
O turbilhão de pensamentos não deixava Quím respirar o ar da tranquilidade do
espírito. Após longos segundos mergulhando no mar dos seus pensares, Quím
regressou à realidade, limpou as lágrimas que maltratavam seu rosto e indagou:
- Qual é o
motivo do teu afastamento?
O
semblante do companheiro murchou, seus olhos começaram a expressar incertezas
que não eram fáceis de ser entendidas e as palavras ganharam vida em sua boca:
- Não vais
entender! - Exclamou com voz embargada.
- Como não te
entender? Somos parceiros ou não? - Quím
questionou meio indignado ao constatar que o parceiro não o tinha como seu
confidente.
- Não é tão
fácil quanto pensas, te contar as razões vai perigar tua vida e eu não quero
carregar essa culpa. - Confessou Zé.
Suas
palavras carregavam um peso tenebroso como se tivesse feito algo de errado que
acabou ditando seu afastamento daquilo que tanto conquistou com trabalho árduo,
sua reputação de polícia íntegro e responsável.
- Não confias
em mim? - A questão ganhou vida na voz de
Quím.
- Claro que
confio mas...
Antes
que terminasse de completar a fala, Zé foi interrompido de prosseguir pelo
batimento da porta que anunciava a presença de alguém que pedia por licença e
em seguida a porta foi aberta por quem lhe agredia.
- Já terminou
de arrumar suas coisas? - Era voz do
delegado Nevinga, antes que o Zé respondesse a indagação, o delegado
prosseguiu: - Rápido não quero ratos a
impurificar nosso ambiente e contaminar nossos íntegros e bons homens.
Quím
permanecia silencioso assistindo a humilhação do companheiro ao mesmo tempo que
tentava decifrar a verdade ocultada pelo seu comparsa do trabalho. Tentava
desesperadamente achar as peças que pudessem se encaixar no seu puzzle.
- Afinal o que
ele fez? - Nasceram as palavras na voz do
Quím.
-
No momento oportuno saberás, agora só
quero que o Robin dos bosques desapareça da minha vista e do meu reino antes
que eu chame os meus bons soldados...
- Não será
preciso meu rei. - Quebrou o silêncio Zé com o
deboche no tom de voz, pois já não temia por represálias que pudesse sofrer.
- Meça suas
palavras Zequinha, ainda sou teu superior.
- Delegado ameaçou.
- Superior qual
quê, o senhor não passa dum covarde. - Rebelou-se
Zé e prosseguiu: - Que tipo de superior é
o senhor que não defende seus homens?
- Amaine os
ânimos Zé, não vale a pena enfrenta-lo.
- Adverteu Quím.
- Segurar-me
perante tanta covardia patente nos meus "superiores"?
-
Siga os conselhos do teu parceiro. -
Afirmou Nevinga.
Permanecendo
silencioso, Zé pegou a caixa que estava na mesa contendo seus pertences saiu da
esquadra com sentimentos exaltados sem ao menos se importar em dirigir palavras
de despedida para aqueles que os tinha como colegas de profissão que estavam
ali para confortá-lo, pois sabiam ou suponhavam que o seu afastamento era um
insulto à sua pessoa. "Como dispensam uma pessoa exemplar no seio da
corporação?" Essa era a questão que pairava nas mentes dos polícias
que se encontravam no corredor da esquadra tentando buscar respostas para seus
questionamentos quando de repente uma voz de autoridade soou:
-
Voltem ao trabalho, antes que sigam o
mesmo destino! - Era a voz do Nevinga intimidando seus colaboradores.
Já
a sós na sala que era sua e do companheiro, Quím procurava respostas para suas
inquietações:
- Afinal
delegado o que ditou a dispensa do meu parceiro?
-
Não queira se meter em coisas que não te
dizem respeito... - Advertiu ao seu cadete no tom de voz ameaçador.
- Não procure respostas em assuntos que não te
dizem respeito. - Concluiu. Quím vendo que o delegado não queria cooperar
preferiu manter-se em silêncio orquestrando um plano que o levaria a descobrir
o fogo que produzia aquele fumo escamoteado nas palavras ameaçadoras do
delegado.
-
Vou descobrir a verdade, nem que tenha que passar por cima da sua
autoridade. - Cogitou Quím.
Autor: Arnaldo Tembe
-Continua-
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