A dublagem ameaça as línguas bantu? - Gerson A. S. Pagarache

Há autores que defendem a adopção da Legendagem (Martins e Amorim, 2013; Giron, 2012), assim como aqueles que preferem a Dublagem (Machado e Venticinque, 2012). A constatação é a de que tanto a Dublagem quanto a Legendagem possuem vantagens e desvantagens, sendo, ambos, mecanismos viáveis para a tradução audiovisual.


Entretanto, ao olharmos para o contexto moçambicano, nota-se que a adopção de cada um destes mecanismos pode ter implicações sociolinguísticas. Segundo os autores Sitoe (2015), Lopes (1997) e Ngunga & Mbavo (2011), Moçambique é um país multilíngue que se encontra em compromisso com a promoção e a elevação do status das suas línguas bantu. E, conforme os mesmos académicos, a televisão é um dos orgãos fundamentais nessa promoção, daí deverem enveredar, sempre que a situação exigir, pelo uso das línguas bantu (Lopes, 1997).


Ngunga e faquir (2012) declaram que ‘’é do esforço de todos e de cada um de nós que leva as rádios e, timidamente, as televisões e os jornais a reconhecer o seu valor e a enveredarem pela utilização das línguas moçambicanas como o melhor veículo de comunicação’’.


Neste cenário, a adopção da Dublagem de uma fala bantu para o português, em situações de reportagem televisiva, desencadeia implicações sociolinguísticas ´´negativas´´ para o país, na medida em que esse mecanismo despromove as línguas bantu, reduzindo o seu status e anulando a sua realização. Conforme Martins & Amorim (2013), a dublagem camufla a língua original do vídeo para dar lugar à língua de chegada (no caso, o português), enquanto a opção por Legendagem consegue manter a fala bantu dos falantes, permitindo a manifestação dos seus sentimentos nas suas línguas, sem haver risco, inclusive, de uma tradução infiel, que a dublagem pode oferecer.


Ainda sobre a tradução infiel, é claro que a legendagem também oferece esse risco, mas, o telespectador (falante da língua de partida) pode confrontar o escrito na legenda com a fala do interveniente.


Martins & Amorim (2013) salientam que a legendagem de um filme/documentário/reportagem mostra-se ser o único meio capaz de preservar intactos os diálogos e os sons originais do vídeo. Este aspecto é relevante quando se assiste a um vídeo Dublado, e nota-se que a voz dublante não se harmoniza com o indivíduo que agente observa na tela (Martins & Amorim, 2013).


Outras vantagens oferecidas pela Legendagem, segundo aponta Giron (2012), é a promoção da leitura, que é um grande contributo pedagógico. Por esta via, forma-se uma sociedade de leitores. 


Mas, acima de tudo, em contexto de tela individual (quando se quer ver um filme em casa ou um documentário com a família), cada um tem o direito de seleccionar a modalidade que preferir (seja a legendagem ou a dublagem). Mas, em situações de transmissão pública, concretamente em contexto multilinguístico como o nosso, ‘‘a Legendagem significa conservar a língua original’’ (Martins & Amorim, 2013), as línguas bantu moçambicanas.


NOTA IMPORTANTE: Este artigo reconhece haver casos de pessoas cegas, que não podem ler as legendas, mas ouvir as falas, assim como a existência de pessoas surdas, que não podem ouvir a dublagem, mas ler a legenda. Este paradigma pode ser colocado em pauta num artigo próximo, com a abertura de outros debates.

Gerson A. S. Pagarache (extraído do artigo original ''As línguas bantu na televisão: Entre a Dublagem e a Legendagem'', publicado em 2016)





Fonte da imagem: www.vlegendagem.com.br


Enviar um comentário

Postagem Anterior Próxima Postagem