MARTELO NA PONTA DA CANETA (Ou anúncio de "Possíveis Freios Para Caos", de Britos Baptista)

A propósito do lançamento do livro de estreia de Britos Baptista intitulado Possíveis Freos Para Caos (Oleba editores, 2021), agendado para o dia 05 de Novembro de 2021, na Província da Zambézia, na Biblioteca Pública Provincial, as 08:30, Leviano, ou Simplesmente Silmério Uaquessa, ensaia-nos a sensibilidade para o que nos espera nessa que é a inseminação primeira de Baptista no universo literário moçambicano. 

Leia-se abaixo:


MARTELO NA PONTA DA CANETA

Às vezes, senão sempre, é mister levar marteladas. Construímos edifícios que nos prendem em doces lares que ao fim e a cabo só têm a nos oferecer um barrote para o suicídio. Aí uma martelada na cabeça, a devolver-nos a vontade de presenciar a vida depois da quase morte, se faz necessária. É a divina função das coisas – se quiserem –, o martelo não fica de fora. 

A função do martelo é destruir, partir, destituir. Não só! Pregar, fixar, construir, instalar, também. É preciso ter coragem, pelo menos uma vez em vida, para carregar um martelo, olhar para o paraíso belo da sua vida e de todas as coisas – mesmo que feitas a sangue e suor – e desconstruir. Do inferno que daí advir reconstruir um paraíso.

É preciso pegar no martelo, com a raiva do mundo na alma e grito da humanidade inteira, sem dó nem piedade, quebrar pilares, espectativas, bases, amores, tectos, paredes, dores, e até o chão no qual os pés estão confortavelmente à sombra. Deixar tudo em ruínas em busca de uma constante reconstrução interior. Sob pena de os martelos da vida nos encontrarem em carne e osso mas alma de vidro e, assim, acabarmos cacos espalhados no chão dos degraus.

Há vários martelos por aí, mas há os martelos que nos despertam no meio da noite da vida; os martelos que nos quebram os ossos da conformidade; martelos que nos cegam, a fim de estarmos condenados a olhar o interior das coisas; martelos que nos partem os pés, a fim de aprendermos a voar para dentro de nós e dos outros; martelos que nos tiram a esperança, a fim de descobrirmos que além da esperança há alguma coisa a mais do que, só e só, esperar a morte. Esses são os martelos temos que ter à cabeceira.

Sobre o evento da apresentação do livro "Possíveis Freios Para Caos"

Aqui está "Possíveis Freios Para Caos", de um homem que de martelo na mão, esmaga a própria esferográfica, e com a lágrima que jorra da alma, chapisca palavras densas, coaguladas, para anunciar a “boa nova” de que, antes de atracar no porto dos sonhos, é preciso estar atento a Possíveis Freios para Caos. 

De uma escrita feita a golpes de martelo, uma escrita que importuna, incomoda, abala, transtorna a cada verso, as bases estabelecidas sofrem sem precedentes. Cada poema, aqui, é uma martelada. Recomendável para quem pretende sair da zona de conforto. O barulho da martelada, a cada leitura, é propositado. É mesmo um despertador de sonos profundos. 

Como se o poeta a cada martelada arrancasse as raízes da fundação das coisas e gritasse ao mundo: “desçam do sétimo céu e venham, descalços, sentir com os próprios pés o desconforto dos escombros aqui na terra!” Pois, propõe-se aqui um Éden, mas, os meus sentimentos para quem pensa que irá encontrar um Adão ou uma Eva tal como lhe foi amamentado desde que se fez humano – espiritual. Se alguém quiser pescar algum peixe neste rio de letras, é preciso mergulhar cego de tudo que viu e vivenciou. Dito de outro modo, é preciso arrancar os olhos da cara e aprender a olhar, as palavras, com a alma... isso, só, para quem pretende perceber alguém com martelo na ponta da caneta.


Por: Leviano (Silmério Uaquessa)


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