Zua não queria ver a Tunguinha nem banhada de ouro. Wita estava decepcionada com a filha. Zua convocou uma sessão extraordinária a nível familiar com o tema subordinado a Tunguinha. Com a família reunida, Zua foi peremptório, ao informar aos presentes que não havia mais lugar para a Tunguinha em sua casa, muito menos condições para coabitação entre ambos. Ou ele ou a filha. Os dois haviam se transformado em gato e rato. A avó Khatazy, por sinal xará da rainha da noite, em prantos pediu o perdão em nome da neta. Porém, Zua estava irredutível. Enquanto a família debruçava-se sobre a sua sorte, Tunguinha não estava para eles e através do seu aparelho celular trocava mensagens com os leões da noite e a sua turma em relação ao local do próximo crime, o txilling. A avó Khatazy apelou ao bom senso do filho, e os restantes familiares reforçaram o pedido da matriarca dos Zunguenes. Zua engoliu o sapo, contudo a harmonia familiar estava minada. A única alegria que restara naquele lar era o Ndhelene. Nos primeiros dias a Tunguinha vestiu as roupas do disfarce, era caseira,comportada, prestatativa, a filha que orgulharia qualquer progenitor; até que a mascara caiu. O malandro não muda só dá um tempo, reza o adágio popular. O tempo passava, o menino crescia, todavia a Tunguinha piorava. Tunguinha regressou à vibe. Ela saía todas as sextas-feiras e só regressava entre segunda e terça. E o Zua em prol do seu bom nome premiou-a com o cartão vermelho, para o gáudio da Tunguinha e sua companhia. O plano funcionou em pleno, pois ela já não suportava mais a intransigência do seu Papai.Wita ficou inconsolável, ficou dividida, afinal era a sua filha que escolhia o lado errado da vida. Com a independência proclamada Tunguinha, passou a ser nómada, tomava o pequeno-almoço em casa da Joana, almoçava com Rosa, lanchava com a Telma, jantava com o Jorge e acordava na cama do Rui.
Abraçou gordos, altos, magros,baixos, foi a guitarra dos predadores insaciáveis. Gemeu em Dodomas, teve orgasmos em guest houses e assentos de automóveis de alta cilindrada. Foi a miss Barba Branca no Bairro 1 ̊ de Maio ˗ Nkonoluene e a fruta preferida dos Madodas do Txila Night no Benfica. Desprezou os seus progenitores e esqueceu o Ndhelene. Caiu nas graças dum velho bóer, que tinha os seus negócios em Moçambique e visitava a cidade das Acácias regularmente. Foi numa dessas andanças que se conheceram, vonversaram, beberam,dançaram e terminaram num dos dentre os distintos bordéis do Xilunguine, sem compromisso, foi uma espécie de dinheiro na mão e calcinha no chão. Como haviam trocado os respectivos contactos, foi fácil o seu reencontro. Depois de algum tempo de silêncio o Bóer quebrou o gelo, ligou para a sua presa, tiveram uma noite de loucos, uma pornografia em miniatura. A uma velocidade supersónica, ele tratou o passaporte para a Tunguinha. Ela começou a ser uma bisca fina, acordava em Maputo e dormia em Benoni. O Bóer ficou viciado pela Tunguinha e não era para menos, ela era muita linda e chamava a atenção de todo homem que não fosse distraído. Não se fizeram de rogados conciliaram o útil ao agradável, juntaram os seus trapos e este rendido a competência e delicadeza com que a rapariga o tocava, levou-a para Benoni em definitivo.
Outro galo cantava na vida da Tunguinha; tudo começava a sorrir para ela, na terra do Rand enquanto o velho cuidava dos seus negócios, Tunguinha ficou dona e proprietária de um salão de beleza, que respondia pelo nome Tunguinhaˋs Beauty no famosíssimo Lakeside Mall em Benoni. O velho bóer tentava a todo custo deixar um príncipe herdeiro no ventre da mulher dos seus olhos, mas debalde pese embora tenham tentado até com médicos especialistas sul-africanos.
Engajados em sua causa, procuraram pelos serviços de uma curandeira reconhecida internacionalmente, por ter um olhar clinico e infalível. A adivinha era natural e residente de Kwazulu Natal. Nkosikazy Dlhamini, vestida de roupas coloridas que só lembram a bandeira dos rastafáris, após consultar os seus ossos e as suas pedras sem pestanejar sentenciouː
- Os espíritos dos Zunguenes estão decepcionados e irados com a Tunguinha por colocar o seu prestigiado apelido na lama, devido à febre da sua saia, e como prémio deram ˗lhe esse presente envenenado de olhos azuis, que lhe dará mundos e fundos, todavia, ela será uma rainha frustrada, incapaz de dar um filho que seja ao seu velhinho.
Através da sua varinha mágica, ia descrevendo o itinerário da Tunguinha naquele espelho sobre as ossadas, pedradas, chifres, peles de jibóias, crocodilos e frascos multicores de odores distintos.Com uma chuva de lágrimas inundando o seu lindo rosto, recordou das três gravidezes que abortara nos tempos de Barba Branca e Txila Night, se pudesse voltar no tempo. Depois de cinco e longos anos de silêncio, aos prantos ligou para a mãe a contar-lhe o sucedido, e esta que padecia de hipertensão arterial desde a partida da sua filha para uma parte incerta, já era uma dependente de fármacos para controlar a evolução da doença, desmaiou. Foi reanimada pelo netinho que já frequentava o primeiro ciclo do ensino secundário. O cell da Wita voltou a tocar, quando o Ndhelene atendeu, reconheceu uma voz familiar do outro lado da linha. Entregou o cell a avó e foi trancar-se no mesmo quarto onde havia queimado com ferro de engomar há um par de anos atrás. Aquele quarto transformara-se em seu museu de amargas memórias.
A maré dos Zunguenes voltava a agitar-se, e o ditado popular ficava de pernas para o ar, pois depois da trégua vinha a tempestade. O Bóer consolou o seu porto seguro. Sossegando-a com juras de amor everlasting. Passados alguns meses o cell do Zua toca e uma voz madura de alguém expressando-e num português maltratado, com soluços e lombas, a mistura apresentou-se como Henrik, o seu futuro genro, e comunicou-lhe, a sua visita para o último fim-de-semana do mês. Por algum tempo Zua ficou mudo e estátua, perante e inesperável ligação e a notícia bomba. Plagiando os Rockfellers, esta vida é uma ressaca já começa a enjoar. Cantava desafinado Zua, discando o cell no intuito de comunicar a família com uma lágrima no canto do olho, e não era para menos a avó Nkatazy que tanto almejou este momento, já jazia no jardim dos mudos. Era necessário preparar o Ndhelene para essa nova fase da sua vida. Quando o genro enviou os rands através do Majugar, para os preparativos do lobolo, Zua teve que engolir o seu orgulho quando fez o câmbio e percebeu que em todos os seus anos de trabalho, nunca tinha visto tanto dinheiro junto. Reza o ditado, todo o Homem tem o seu preço. Estava na companhia do irmão, e no barulho do seu silêncio chorou feito o seu netinho, perguntando pelo paradeiro da mãe, quando bate a saudade. Zua estava abraçado à mala da lotaria, enquanto fazia a retrospectiva dos aborrecimentos causados pela Tunguinha. Os Zunguenes organizaram uma festa de pompa e convidaram todos os linguarudos da vizinhança. Ideia da Wita, afinal como doméstica, perdeu a conta das vezes que foi zombada pela vizinhaça, na sua banca caseira, devido ao comportamento da filha. A festa iniciou no final da sexta-feira e só teve o seu término ao meio dia de Domingo. Quando os pombinhos chegaram no seu pomposo Range˗ Rover preto, e outros dois carros: um BMW, e um Mercedes˗Benz. Para o espanto dos presentes, Henrik tinha a mesma idade que o seu sogro. Queixumes a parte, a festa iniciou logo após a visita e limpeza da campa da avó Nkatazy pela manhã com a apresentação no período da tarde da sexta-feira e o lobolo no sábado. A festa bombou e foi falada durante muito tempo. Alguns dos vizinhos até saíram com garrafas entre às axilas e outros caíram depois de tanto beber na festa. Enquanto Henrik na companhia da sua esposa pegava o seu longo caminho de regresso a Benoni.
Passado um tempo Tunguinha comprou um talhão 40 por 40 em Tchumene. Ergueu uma casa tipo 3, numa das metades do talhão e noutra metade construiu uma mercearia para a mãe, comprou uma camioneta para o Zua e matriculou o filho no Colégio Paraíso. A justiça divina tarda mais não falha, dizia o casal Zunguene. Ironia do destino, a mesma menina que causara sofrimento aos pais, hoje proporcionava-lhes alegria e dava-lhes segurança. Na terra do rand o casal Henrik vivia um autêntico conto de fadas. Ndhelene passava temporadas com a mãe, sempre que tivesse férias escolares. O tempo passou, e nisto o Ndhelene concluiu o nível médio, e teve uma bolsa de estudos na Wits University às custas do Padrasto, os Zunguenes já viviam aliviados, a Tunguinha continuava com seu Henrik, a vida ia ao ritmo de Deus, até ao dia que o Bóer voltou cedo sem avisar com um buquê para a sua esposa e para a sua maior decepção, encontrou a Tunguinha em orgias e a gemer nos braços do cabeleireiro do Tunguinha’s Beauty. Henrik disparou a queima-roupa contra o seu criado e pagou um bilhete na Intercape para a sua agora ex, de volta a Maputo com uma mala de roupas, maquilhagem e roupas de corpo. Tunguinha não teve a coragem de ver a cara dos seus progenitores. Em virtude disso, ela zanza pelas ruas de Maputo, com lábios pintados, beatas e um copo de zed na mão em memória aos bons e velhos tempos, quando deliciava-se com o seu velhinho com o Jack Daniels, sabor a mel e a sua inseparável mala, cantando em Changana, Portuguȇs, Zulu e Inglês. Se alguns morrem pelo próprio veneno. Tunguinha foi vítima de si mesma.
Nota ːQualquer semelhança com o que quer seja é pura coincidência.
Minyetani Khossa
Vocabulário
Txiling ˗ divertir/divertimento
Vibe ˗ inglês vibração, diversão
Barba Branca e Txila Night ˗ casas de pasto
Bóer˗ afrikaans, brancos naturais da África do Sul, descendentes de Holandeses
Bisca ˗ mulher safada
Xilunguine ˗ nome tradicional da Cidade de Maputo
Lakeside Mall ˗ Hipermercado em Benoni
Nkosikazy ˗ primeira esposa em algumas línguas Bantu
Everlasting ˗ inglês - eterno
Rockfellers ˗ uma banda jovem de Rock Moçambicana
Majugar ˗ Transportadora Moçambicana Luciano e Filhos
Lobolo ˗ casamento tradicional
Wits University ˗ universidade localizada em Joanesburgo