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Seus olhos pareciam estar distantes como as estrelas que são nítidas no cair do pano diurno. Viandava de um lado para o outro, como se seus pés não soubessem o caminho que os pensamentos pretendiam seguir.
- Está tudo confuso.
Afirmou desanimado continuando na sua viandisse que lhe levava a lugar nenhum e criando tonturas na dona Celina, sua costela feminina.
- Acalma-te homem, senão vais desgastar a sola dos teus pés.
- Deixa-me mulher. - Gravizou sua quarta voz. - A minha cabeça regula bem quando estou em movimento.
Dona Celina limitou-se a acompanhar as idas e voltas que o marido lhe brindava. Pensou em abandonar aquela secção, pois a regulação do órgão pensante do cônjuge começava a lhe fatigar os miolos, mas lembrou que o fardo da tradição lhe impedia de abandoná-lo no processo meditativo. Segundo a tradição, os pensamentos do homem norteiam o destino da família ao bom porto.
- Não ti cansas de maltratar o chão?
- O chão foi feito para ser pisado, caso contrário não estaria debaixo dos nossos pés.
Mutsendzeleki continuava viandando de um lado para o outro, a mulher acabou se aborrecendo abandonou a frescura da sombra do cajueiro rumando às suas conferências femininas. O semblante do homem, continuava amalfanhado nas entranhas da seriedade, acomodou-se num tronco e sentiu o peso dos pés lhe inundar a cabeça. Começou a inspecionar o seu lote, e a desilusão lhe namorou as vistas.
- Se tivesse ficado em Djermani talvez teria sido melhor. - Pensou alto.
Seus olhos pressagiaram o limiar de algumas gotículas salgadas: “homem não chora”, a voz da sua mãe lhe veio como os fantasmas que recusam morrer mesmo sabendo que a existência não lhes pertence. Engoliu as lágrimas aumentando a barragem formada ao longo dos tempos no seu íntimo. Se um dia o nó das comportas da alma do Mutsendzeleki decidir desnodar-se, é capaz de afogar todas mágoas da terra e da felicidade do céu.
A solidão lhe encheu o peito como o oxigênio que engordesse uma cama insuflável. Germany, o substantivo próprio se grafitou na aba dos seus castanhos olhos. Por instantes, amaldiçoou mentalmente o chão que pisava e o sangue que circulava nas suas veias, mas estabilizou as suas emoções; aquela terra lhe doara o calor materno e o liquido viscoso lhe servia de combustível para existir.
- Por que Deus nos tirou a liberdade de escolher onde nascer?
A indagação lhe escapou dos beiços como uma criança que se descuida para a infelicidade dos progenitores. Olhou para o céu como se esperasse pela resposta da sua pergunta, mas o vôo dos corvos tingiu a beleza dos seus olhos.
- Ah, se a vida fosse como a beleza do céu, com certeza… – Descomplemetou a frase enchendo o peito com o oxigénio do mundo poluído.
Mecanicamente, dirigiu a mão esquerda para uma das algibeiras do seu casaco naposo de cor preta, que lhe servia de memória da sua precoce estadia no Djermani. Na algibeira, procurava alguns fragmentos das biatas que colecionava para lhe alinhar os miolos caso os pensamentos lhe desequilibrasse o sistema neurológico. O ermo do bolso lhe tocou as pontas dos dedos como as gotículas da chuva que beijam a imensidão do mar.
- Merda…
- O que foi homem?! – Perguntou dona Celina voltando das suas incursões.
- Ah mulher! A vida tem me encurtado o apetite de viver. – Desabafou.
- Se tivesses ficado no Djermani, quem sabe a vida nos tinha sido de sorrisos e farturas, de agrados e felicidades…
- Não digas disparates mulher… a sorte tem donos e o azar me persegue desde o berço.
Dona Celina se limitou a amordaçar a boca com o silêncio, não quis continuar com o diálogo para não ser contaminado pelo vírus fustracional do marido, preferiu procurar outros fóruns uma vez que, as suas comadres não estavam disponíveis. Mutsedzeleki, ficou ali contemplando o ermo da sua desilusão vital e suspirando desânimos infinitos.
- Na próxima encarnação, prefiro morrer do que voltar a viver nestas condições… – Confessou ao vento.
Por Arnaldo Tembe