um musculoso trovão pragueja, rasga as alturas, e, no ventre da abóbada celeste desenha um gigante <Z> que lembra o lendário ZORRO; a chuva intensifica-se, chicoteia a longa fileira de robustas mangueiras, picota o chão fazendo a areia dançar grão a grão
um homem baixo, escuro e magro vem cambaleando por debaixo das mangueiras. ele é tão magro que no seu cambalear consegue esquivar até as mais finas gotículas da chuva, sendo assim, seu vestuário ainda está completamente seco, intacto
o homem continua a cambalear, os troncos das árvores são o seu confiável corrimão. de repente, interrompe a marcha; com a testa, apoia-se no caule da mais próxima mangueira, abaixa as suas curtas mãos até à cintura, desmonta o bling-bling, liberta a sua mangueira humana e põe-se a regar os calcanhares do vegetal, do qual uma fumaça fedorenta começa a nascer como se de uma chaminé se tratasse. a irrigação cessa, o homem sacode a sua mangueira humana, devolve-a ao seu devido habitat e tranca-a com o zip
o homem reactiva a cambaleante marcha, o trovão volta a rugir como um leão faminto no parque de gorongosa, mas desta vez desenha um xadrez indescritível no céu; o homem assusta-se, perde o equilíbrio, cai, porém eleva a garrafa de txilar na mão esquerda, não a deixa tocar o chão, é o seu precioso tesouro, levanta-se. continua
o seu coração ribomba-lhe o peito. o homem, para disfarçar o susto, começa a cantar
<<passarinhouuu, está comer arrojjo…;
passarinhouuu, está comer arrojjo…>>, aborta a canção, remata mais um gole; o trovão fotografa-lhe com a luz
<<passarinhouuu, está comer arrojjo…;>> reentoa a “canção” do seu favorito músico;<<passarinhouuu, está comer arrojjo na machamba>>
de repente, sente que alguém lhe segue os passos. e lembra-se do que a mãe sempre lhe dizia <<andari de noiti é pregozu, porque barkabunda também actua de noite e não gosta de ser atrapalhado>>. o homem ignora esta lembrança, começa a gritar
<<eu não ter medo de ninguém, eu ser mazamera, o homem que nunca bebe kabanga nem xibuku lá no senta-baxo. eu ser o homem que sefrimento tem medo dele>>; degola as falas para engolir mais um gole da sua txilar
<<você que está me seguir, nem valo-pena se esconder, eu já te vi com os meus olhos de atrás, melhor parecer logo>>
o trovão volta a rugir mais forte que nunca. o nosso homem, o mazamera, neste caso, assusta-se, tropeça nos seus próprios pés e cai, parte a sua deliciosa txilar. e insulta:
<<fidamãe>>
e é quando, quatro homens altos munidos de catanas e machados circundam-no e um deles diz
<<queremos toda tua salário, sabemos que você recebeste hoje, por isso que bebeste txakutchene>>
mazamera, diante daqueles homens ainda tira um tempinho para se gabar
<<txakutchene não é bebida para eu. um gajo que até 2019 ainda é um assimilado. me respeitem, seus mbavas…>>
os homens não o deixam terminar o palavreado. baptizaram-lhe as bochechas com um mar de chapadas, roçaram-lhe as nádegas com as gigantes botas que trazem
mazamera está abraçado ao chão. um dos homens sequestra-lhe a carteira do bolso esquerdo, e logo tira as infinitas notas verdes. os amigos juntam-se a ele ansiosos para dividirem o mussuruku
de repente, numa das mangueiras, surge uma senhora escura, toda roupa alagada; ela traz consigo dez cães, e sem demora ela grita:
<<wu… wu… wu…. wu…. wu…wu>>
os mbavas desatam a correr
<<gui-gui-gui-gui-gui…>>
os cães perseguem os mbavas.
a senhora acorda o mazamera e diz:
<< mazamera, deixa de se deixar sefreri por andar de noite. esses barkabunda vão te matar>>
***
assim foi o primeiro sefremento de mazamera
desafio Daúde Amade a escrever o segundo “sefremento”