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Estou triste como um livro empoeirado, estagnado na estante, farto de nunca
ser lido; um livro que se vai auto-despedaçando porque nenhuma voz lhe lê as
páginas grávidas de morfemas.
Estou triste como um lexema sem representação ortográfica, sem
enquadramento sintáctico nem semântico possíveis; triste como um fonema que já
não cabe na escala diatónica da fonética linguística.
Uma alma triste é como um vaga-lume que já não se sabe acender; uma pessoa triste é uma estrada calva na
qual o tempo vai engolindo as pegadas da vida; é verdade, estou triste como
a "caged bird" da Maya
Angelou, por isso recito:
1
[...]
I
sing
with
a fearful trill
of
things unknown
but
I long for still
and
my tune is heard
on
the distant hill [...]
Esta maldita tristeza perturba-me a casa do raciocínio, e deixa-me confuso
como um puzzle desprovido de palavras, sendo assim, os meus pensamentos
não conseguem respirar os fundamentos da lógica humana, divagam sonâmbulos
pelos pântanos da vida balbuciando monólogos monótonos e sem nexo.
A tristeza é a
navegante mais ousada que já existiu. É uma hóspede que ninguém faz planos
para recebê-la, mas, é tão gentil, assídua e atenta que visita a todos. Ninguém
dela se escapa; ninguém a consegue repelir. Quando pede licença é para entrar,
turvar, deixar hematomas e ir-se embora.
Naturalmente, por onde passa deixa moléculas para poder germinar facilmente
quando quiser retornar. Ela, nunca falha, cedo ou tarde, sempre retorna. É a
mestre das visitas clandestinas e age como um leão: ataca surpreendentemente
antes que o alvo se prepare.
Ora, apesar desta tristeza que me entristece, é hoje que me apetece existir
intensamente, isto é, transformo as muralhas do abismo que me consome(m) em
janelas de alvorada.
Acredito que se existisse uma fábrica de reciclagem de sentimentos ou
emoções, a tristeza seria sempre transformada em felicidade; duvido
muito que o inverso aconteceria frequentemente, porque poucos clientes se
atreveriam a comprar TRISTEZA a não
ser que sofressem de algum tipo de transtorno emocional.
Quero dizer: o âmago da vida são os encantos, porém os
desencantos complementam-na. Em vista disso, cada um deve sempre estar pronto para degustar a vida na
presença dos dois, mas sempre que os desencantos se tornarem mais efervescentes
deverá se lembrar do velho ditado: depois
da tempestade vem a bonança; ou seja, depois da tristeza vem a felicidade. Aliás, segundo Romain
Rolland, "A vida não é triste.
Tem horas tristes"2. Então, eu não sou triste, apenas estou triste (o que é normal).
A vida nunca foi linear (e nunca será), sempre teve ups and downs (e sempre terá), por isso
deve haver resiliência para cair e se levantar o mais rápido possível. A tristeza não marca o fim do percurso na
esfera cósmica, mas sim uma ponte para a felicidade. Só quem conhece o peso da
Tristeza poderá escolher a balança certa para Felicidade.
O mais importante na vida é lutar contra todos obstáculos e sempre manter a
cabeça erguida. Que venha a tristeza mas nunca se deve esquecer que todo humano
tem um dom especial, o dom de ser feliz. Aliás, é como diz Barga (2016:49)
[...]
O importante na vida é saber ser feliz,
mesmo quando a vida te nega ser feliz
Busca a felicidade na mais simples coisa
e nunca permitas que a nuvem apague
o brilho do teu sorriso
Dá-te à ti mesmo a oportunidade de ser feliz
e descubras o dom que carregas dentro de ti
o dom de ser feliz!
Em suma, estou triste como um deserto pálido e sem oásis nas suas coxas
híbridas, mas brevemente já terei conhecido o verdadeiro peso da tristeza e
consequentemente serei capaz de escolher a balança certa para a felicidade.
Estarei feliz como as ondas do mar que se entrelaçam na imensidão líquida da
vida e imitam a sinfonia Bethoveniana.
Estarei feliz como um jardim recheado de orquídeas que peidam o aroma mais
agradável do planeta.
Referencias:
1https://www.poetryfoundation.org/poems/48989/caged-bird
2http://www.citador.pt/frases/a-vida-nao-e-triste-tem-horas-tristes-romain-rolland-1032
BARGA, Alex. Aliança com a Solidão. 1a ed. Maputo. Imagem
Real.2016.
Autor: Fernando Absalão Chaúque
De facto, deixar que a tristeza habita, é renunciar à vida
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