Vidro Rasgado - Capítulo 11



Vidro Rasgado - Capítulo 11

Vidro Rasgado - Capítulo 11

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Os raios solares perdiam-se nas frestas da lona que criava uma barreira para não expor os clientes do restaurante "Além-mar" ao sol. A tarde estava escaldante, o sol não dava tréguas para se contemplar a sua beleza luminosa. A brisa tinha se ausentado do mundo, tornando o mesmo num inferno. Alguns reclamam da condição atmosférica e outros acusam Deus de lhes ter abandonado a própria mercê. Enquanto isso, delegado Nevinga degusta da lagosta grelhada que era a especialidade do Além-mar, aproveitando o seu dia de folga que acabou sendo interrompido por uma ligação telefónica. Atendeu com urgência, pois a chamada vinha da esquadra.

- Alô! - Impôs autoridade na voz.

- O Zé e o Quim foram baleados. - Jorpa noticiou o acontecimento.

- Estão vivos? - Encenou uma voz de preocupação e desespero.

- Sim estão, porém a situação deles é crítica.

- Merda, esses gajos duros! - Pensou delegado deixando o seu interlocutor num impaciente monólogo.

- Delegado estás aí?

- Sim estou, a informação abalou meu espírito. Em que hospital estão?

- Mas que pergunta é esse delegado? O senhor não sabe da existência do hospital policial?

- Desculpa, ainda estou a digerir a informação, custa-me acreditar que os meus homens sofreram um atentado. - E prosseguiu: - Estavam juntos?

- Segundo um relatório preliminar, foram encontrados numa estrada de terra batida perto duma cabana localizada no Farol dos Ventos Cristalinos. - Informou com voz indecisa.

Continuaram o diálogo por alguns segundos até a mesmo minguar e delegado já na companhia do sozinho divagava nos seus devaneios.

- Os tipos falharam a missão, incompetentes de meia tigela! Assim terei que sujar minhas mãos.

Pediu a conta do seu consumo e abandonou o Além-mar rumo ao hospital policial, talvez para concretizar o seu pensamento ou para prestar apoio aos colegas feridos.
Caminhou até o estacionamento do restaurante e entrou no seu automóvel, um Peugeot modelo 1989, ainda sentido a graça da juventude na sua lataria.
Mal o delegado entrou no veículo o seu dispositivo móvel voltou a tocar. Pegou no mesmo e viu através do ecrã um número desconhecido pelos seus olhos.

- Merda, deve ser o chefe! - Cogitou muito furioso e atendeu o telefone:

- Alô... - O seu tom de voz mostrava uma certa insegurança.

E doutro lado da linha telefónica, o indivíduo parecia estar muito nervoso e furioso.

- O teu pessoal está começar a me criar distúrbios mentais. - Afirmou.

- Não se preocupe chefe, vou resolver os problemas pessoalmente.

- É melhor, o teu pessoal se mostrou incompetente e já esgotou a minha paciência... - O indivíduo descarregou tais vocábulos já sem paciência para aturar as falhas dos homens do delegado.

- Não se preocupe chefe, de hoje não passa...

O chefe, desligou o telemóvel deixando o delegado a conversar com o silêncio. Em seguida, delegado Nevinga desconectou o aparelho da sua orelha e ordenou o Peugeot a manchar rumo ao destino que tinha traçado. A chave foi rodada pela mão direita para dar "start" à marcha, o automóvel tremeu silenciosamente e pôs-se a cumprir as ordens do seu proprietário.

••••

Zé e Quim estavam acamados no mesmo quarto, recebendo os cuidados intensivos por parte dos médicos, pois as balas tinham-lhes atingido em áreas sensíveis do corpo. A intenção dos atiradores era fazer-lhes desaparecer do mundo dos vivos, visto que os dois eram ameaças para certas individualidades.

O quarto em que estavam instalados respirava a cor branca nas paredes, equipado de máquinas cirúrgicas e inalando um ar característico dos hospitais, criava náuseas no Quim que estava num estado muito grave do que do seu comparsa. A luz florescente picava a vista do Quim como agulhas. Virou para o lado esquerdo e viu o Zé estático como se não estivesse a sentir dores olhando para o tecto.

- Será que sentes as dores que estou a sentir? - Perguntou com tom de voz quase inaudível.

- Claro que sinto, mas a dor que sinto não é dessa bala que está no meu corpo. - Afirmou Zé meio sonolento.

- Que dor é essa? - Quim perguntou ansioso por ouvir a resposta do companheiro.

- A dor da decepção e da... - Acabou desmaiando por causa dos fármacos que estavam a fazer efeito no seu corpo.

- Sempre enigmático! - Sussurrou Quim sorrindo e desmaiou também.

Os médicos continuaram com os seus trabalhos incansáveis, tentando extrair as balas que tinham atingido os polícias.

O frio se fez sentir no corpo do Quim, os aparelhos que monitoravam os sinais vitais do mesmo começaram a apitar criando um barulho insuportável.

- Rápido antes que aconteça o pior! - Ordenou o médico para os enfermeiros que estavam em serviço.

- Acho que já o perdemos. - Afirmou um dos enfermeiros com voz cheio do desânimo.




Autor: Arnaldo Tembe



Fernando Absalão Chaúque

Professor, escritor, poeta e blogueiro. Licenciado em Ensino da Lingua Inglesa. Autor de ''Âncora no ventre do tempo'' (2019) e co-autor de ''Barca Oblonga'' (2022).

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